Mordidas foi concebida como um projeto de conclusão de uma fase, que, com sorte, esperamos inaugurar muitas outras. A primeira edição é resultado do desejo voraz de quatro amigos de devorar a arte drag belorizontina. Um desejo que é muito anterior à concepção do projeto, mas que encontrou nele os meios necessários para tentar saciar uma fome nossa que, assim como nos versos da poeta mineira Adélia Prado “Não quero faca, nem queijo. Quero a fome”, era menos a ausência e mais a vontade, o impulso e a urgência de consumir e conhecer mais essa cena que pulsa na capital mineira.
O que pode a drag belorizontina? Sem a pretensão de trazer um retrato completo em apenas uma bocada, a Mordidas oferece uma degustação de uma cena que, felizmente, descobrimos ser grande e diversa demais para caber aqui por completo. O que trazemos são recortes; pedaços; mordidas. E, através dessas mordidas, esperamos que cada pedaço revele a você, pessoa leitora, novas texturas e sabores, deixando a vontade de morder de novo. Assim, o título da revista não apenas anuncia um formato que reconhece o apetite envolvido no consumo de arte e entretenimento, como também provoca para a potência dos dentes, que aqui são órgãos que cravam e apreendem fragmentos de um mundo.
Este primeiro número é, sobretudo, um convite a buscar pelas personagens e cenários que nutrem a arte drag em Belo Horizonte, seja você um entusiasta do tema ou um apreciador de primeira viagem. Porque foi este, também, o exercício ao qual nos propomos. Cada artista e cada palco escolhido para esta edição foi, antes de tudo, experimentado através dos nossos olhos encantados como público e como fãs.
E que banquete nos esperava. Uma potência criativa efervescente que atravessa diferentes espaços e encontra em cada palco a possibilidade de experimentar e reimaginar receitas de performances drag. Um diversificado menu de perfis de artistas que não só podem ser performers, apresentadoras, dançarinas, humoristas e costureiras, como na maioria das vezes são muitas dessas, e outras, ao mesmo tempo. Na impossibilidade de defini-las em uma única palavra, concebemos as categorias que, em uma tentativa bem humorada de apresentá-las, abrem suas histórias. Que desafio, aliás, o de organizar os relatos vibrantes e ricos em detalhes, colhidos em entrevistas, em histórias que coubessem no espaço limitado de uma página online. Uma verdadeira prática de montação, feita pela redação sensível de Anna Vilela.
Em outras seções, você vai encontrar o relato apaixonado de Wallace Pacheco e suas investidas como público e torcida em concursos de drags, a narração encantada e minuciosa de Juan Santos de uma noite no ballroom e a exploração do que é ocupar o espaço público para corpos queer de Felipe Pellucci. Nossos convidados, o professor Carlos Mendonça traz um artigo, escrito especialmente para a edição, sobre a cena drag musical à brasileira, e o jornalista Elias Fernandes pensa a trajetória da arte da montação, em Belo Horizonte, a partir de uma ideia de resistência.
Como resultado de todos estes processos, a Mordidas chega ao mundo com o desejo de ser um espaço de apreciação desse irresistível caldo cultural drag que ferve BH. Esperamos que o conteúdo possa inspirar os entusiastas que já alimentam a cena e, quem sabe engajar novos apreciadores. Afinal, a cena só se mantém viva enquanto houver quem assista, valorize e celebre as artistas drags belorizontinas.
Boa leitura e bom apetite!
Belo Horizonte,
janeiro de 2025
A redação

editorial




2025
BELO HORIZONTE
FICHA TÉCNICA
concepção e redação
Anna Vilela / Felipe Pellucci / Juan Santos / Wallace Pacheco
colaboração
Carlos Mendonça / Elias Fernandes / Juarez Guimarães
direção de arte
Felipe Pellucci / Juan Santos / Wallace Pacheco
edição e orientação
Juarez Guimarães