




Desde o nascimento de Voga, muito fica claro o quanto se lançou inteiramente no universo drag, sem resguardas para as dores e alegrias de ser drag em BH. Voga estabeleceu um verdadeiro relacionamento com a capital mineira, oscilando entre os estágios de paixão e de dúvidas, pois, para ela, existem inúmeras críticas à estrutura, aos produtores, às injustiças, à falta de visibilidade e ao etarismo da cena. Contudo, Voga ama, mesmo, Belo Horizonte e quer utilizar de seus recursos para fazer a diferença na cidade.
“Eu estou entregando toda a minha juventude para essa arte [...] Eu estou deixando de viver tanta coisa que poderia estar vivendo. Eu estou me doando para essa arte. Será que está valendo a pena? Então, já tive esses momentos de reflexão sobre isso, mas eles eram rapidamente acalentados com essa minha vontade genuína de continuar sendo drag queen, de continuar me sentindo bem com essa minha arte.”
Enquanto existir, estará sempre na busca de demonstrar a gratidão que sente pelos encontros, alianças e amizades que teceu no decorrer de sua carreira, sem as quais, em suas palavras, não teria conseguido chegar até aqui.

Agora, o plano de ação é continuar aperfeiçoando sua performance, seja na maquiagem, seja nas artes cênicas, ou como DJ e dançarina. Novos projetos não faltam. Voga pretende fazer um filme sobre a história de sua vida, com o objetivo de mostrar ao mundo como foi para ela enfrentar os paradigmas cisgênero heteronormativos, a marginalização econômica e uma família ultraconservadora, além da vontade de fazer parte do elenco de RuPaul’s Drag Race Brasil, que, embora hoje não seja sua prioridade, seria uma oportunidade de ouro, caso aconteça.
Voga nos conta que sofreu muito com pessoas que subestimavam sua história e sua arte. Se hoje vive um momento de visibilidade e valorização, ela colhe os frutos diretos de sua persistência.
“Então eu fui uma drag realmente under do under porque eu quebrei essa questão de que eles queriam não me enxergar. [...] Eu pensava: Vai chegar meu momento. As pessoas ainda vão saber que eu sei muito mais do que fazer roupa”
Não restam dúvidas, o momento, enfim, chegou. Fashion, livre como a força punk e com o impulso do mais intenso Under do Under. Mas leve, com orgulho, recheado da mais profunda gratidão e da esperança de um futuro brilhante com os novos desabrochares da cena drag queen belorizontina.



“A minha missão como drag é não ficar na sombra”
Voga defende que ser drag queen vai muito além da montação, da maquiagem, das perucas. É preciso ter um propósito para a arte e o seu, aonde quer que vá, é encantar, mostrar a pluralidade da arte drag, ser voz para outras pessoas que se identificam, expandir-se para fora da bolha LGBTQIAPN+. Também, deseja romper ciclos de desvalorização e promover uma verdadeira mudança na cena drag queen de Belo Horizonte.
“Tem gente que tem menos maquiagem e a força política é muito mais forte do que alguma gata que tá super maquiadona. Então não é sobre só maquiagem, não é sobre só peruca. É sobre juntar tudo isso e colocar no liquidificador.”
No X, seu palco online e rede social mais ativa, Voga costumava se batizar como Plastic Voga, já que sempre brilhou na fabricação de looks feitos de plástico. Mas com 10 anos de carreira e uma evolução exponente, foi preciso dilatar-se.
“Metallic Voga é a digestão da Voga. [...] Ela deixou de ser de plástico e virou de metal, uma coisa meio titânio.”
“É meio doloroso isso de esperar o momento, porque parece que nunca vai chegar.
E nem acho que eu estou de fato na minha melhor fase da minha vida inteira, porque essa eu ainda hei de viver, mas até então no que eu já vivi, eu acho que eu estou no melhor.”
Foto: Victor Piroli

Uma diva
Lady Gaga
Um suco
Melancia. Natural.
Não vivo sem
Ketchup!
BH é
Under do Under
Um sonho
Ter uma vida financeiramente confortável
Um medo
Muitos e todos têm em comum a palavra solidão.
Ser drag é
Ser disruptiva
Voga por Voga
Under do Under
Foto: Reprodução/X/metalicvoga

Foto: [1] Victor Piroli, [2] Iury Emanuel

Foto: Yury Oliveira

Foto: Vox Brand

Foto: Iury Emanuel

Encontre Voga:

Mas a primeira vez não foi como esperado…
Voga se montou sozinha e detestou. Até que sua amiga pessoal, Pietra LeBlanc, na época já uma drag experiente, entrou em cena como sua mãe. Desse modo, fez Voga perceber que podia, sim, sentir-se bonita como drag. Contudo, devido à incompreensão de seu namorado e à sua imaturidade naquele momento de vida, Voga passou um ano sem se montar novamente, até que o relacionamento tóxico chegou ao fim. Mesmo sem os apetrechos necessários ou até mesmo um nome artístico, com o apoio dos amigos se montou novamente e, sentindo-se linda, realizou um sonho e despertou muitos outros.

“Agora eu vou me montar, agora eu vou ser drag sim!
[...] Não tem como mais eu esconder que eu amo essa arte drag e agora eu vou contra tudo, contra todos. Tô nem aí. Se ninguém tá gostando, eu gosto! [...] Eu vivi meu momento, no mais cru da minha vivência.
Então eu tive a plenitude do meu sonho.”

Foto: Estudio Ives


Fundada no disruptivo, no punk, na obscuridade de filmes e jogos agressivos e em referências como Linda Evangelista, Freddie Mercury, David Bowie, Grace Jones, Madonna e Vivienne Westwood, Voga é supermodel e estilista de suas próprias roupas. Intitula a si mesma e a sua arte como “Under do Under”, porque acredita expressar o underground da forma mais genuína possível em seu corpo e em sua vivência drag queen. Segundo ela, ser under é utilizar de uma cultura marginalizada, realmente fazendo parte dela, e não se apropriar desses recursos com interesses comerciais sem experimentar essas vivências minoritárias.

Fotos: [1] Masayoshi Sukita, [2] Steven Meisel, [3] Jean-Paul Goude, [4] Chris Moore, [5] Queen Productions Ltd, [6] Jillian Edelstein
“Realmente eu sou underground mesmo.
Até porque, no Brasil, só de ser drag você já é a margem.[...] Então eu tenho essa energia clubber, eu tenho essa energia underground.”

Foto: Marcelo Batista

Essa drag queen é Under do Under quando não tem medo de se posicionar no enfrentamento de paradigmas, quando revela sua origem socioeconômica marginalizada, quando desafia os obstáculos impostos, quando expressa seu corpo queer de forma livre e potente, quando é apaixonada pela cena drag de Belo Horizonte e quando se identifica profundamente com a artista Lady Gaga.
Então é óbvio que não tem como falar de Voga sem falar de Gaga. Para além da mais profunda inspiração política e estética, a diva pop também deu origem ao nome da artista belorizontina. Voga é uma junção do V de Vinícius, seu criador, da Gaga e da Revista Vogue. É estar em voga. Lady Gaga veio antes mesmo de Vini conhecer profundamente a cultura drag e foi o pontapé inicial para o início dessa trajetória que, em 2024, completou 10 anos.
Foto: Acervo pessoal


“Quando eu vi a Lady Gaga, aquela mulher super empoderada [...] Ela tinha uma sobrancelha que não era dela, ela tinha uma boca que não era dela que ela desenhava por cima, ela tinha pintas falsas, eu falei:
‘Gente, ela é uma drag queen, tipo escrito, assim, desenhado, literalmente’. E foi aí que eu falei:
‘Eu preciso ser como ela. Preciso’. ”
Foto: [1] Acervo pessoal, [2] Iury Emanuel




“No dia que eu parar de me divertir, é o dia que eu vou parar de me montar.[...] E eu acho que isso vai ser nunca.”
Uma Bitch Under do Under
No estilo “Fashion Queen”, o desafio é não olhar quando ela passa, porque a presença é chocante. Voga é a potencialização, a lente de aumento dos absurdos e diversões de seu criador, Vini Vetorazzi. E não importa a maneira, nasceu para encantar! Já ouviu falar de vadia que também é simpática?


“Acho que o mínimo que a gente tem que fazer quando se monta é realmente tratar as pessoas bem. Meu maior talento acho que é isso. [...] Se me contratou, eu vou ter essa missão de encantar as pessoas, de fazer essa conexão, de trazer para esse meu universo.”

A criatividade de Voga é uma característica que a acompanhou durante toda a vida, nas mais diversas expressões artísticas. Porém, uma área em especial sempre se destacou: a moda. Hoje graduada em Design de Moda e com vasta experiência na área, é modelo, costume designer e fashion stylist da “Vetorazzi Haus”, sua marca de roupas. Veste inúmeras drag queens e modelos, extrapolando, exponencialmente, os limites da capital mineira.
Entretanto, não foi nada fácil chegar até aqui, Voga sofreu muito com o medo de ser expulsa de casa e com a visão de uma família evangélica radical que dificilmente a aceitaria, mesmo que hoje, felizmente, conte com o apoio e respeito de sua mãe. Ainda, Voga tem origens periféricas, foi bolsista na graduação e também a primeira pessoa de sua família a fazer faculdade. Mas, se por um lado os obstáculos socioeconômicos tanto dificultaram sua trajetória pessoal e profissional, por outro, a ausência de recursos fez urgir uma criatividade e habilidade imensa para se empoderar e transformar materiais baratos e não convencionais em peças de qualidade. Para Voga, essa é sua essência “Under do Under”.



E como na graduação Voga não tinha condições de pagar por uma costureira, ela mesma precisou aprender e fazer esse trabalho. Contudo, pegou gosto e começou a fazer roupas para outras drags, sendo aos poucos reconhecida por isso: ‘Nesse exercício de criatividade de fazer roupas para outras queens que eu me tornei estilista”. E como tudo também pode ser complicado, Voga passou por um longo processo de autossabotagem até se sentir segura para se autodenominar estilista, recisando de validação externa — como o convite para realizar um desfile de suas peças no Mercado Novo, no mês do Orgulho LGBTQIAPN+— para assumir seu trono como Fashion Queen.
“Sempre gostei dessa moda mais alternativa.
[...] Sempre fui conhecido como aquela drag Art Attack no meu começo. Aquela drag que faz tudo com o que tem. [...]
Eu era tão bom em transformar porcaria em luxo, que as pessoas acreditavam que aquilo era realmente luxuoso.”
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estilista underground

Foto: Renato Ronnie

Foto: Reprodução/X/metalicvoga

“Eu entrei no carro, mas eu só fui
aprendendo mesmo durante a estrada”
Voga queria muito viver sua fantasia de ser a Lady Gaga, de homenageá-la. Então, tentava ao máximo reproduzir os visuais da artista. A partir daí, começou a fazer impressões como freelancer em festas com temática da cantora. Assim, viu a oportunidade de tornar sua vivência drag queen em uma segunda profissão, encontrando morada na cena drag de Belo Horizonte. Porém, aos poucos, Voga questionou sua identidade. Afinal, quem era a drag por trás da impressão de Gaga?
“Não, eu quero fazer outros tipos de montação. Eu quero descobrir quem é a Voga. Aí eu comecei a me inspirar mais em ícones fashion da moda.[...] Ficar olhando a roupa da Gaga para fazer igual, aquilo foi uma escola onde eu aprendi a fazer aquele estilo de vestimenta.
Mas eu conseguia criar a minha assinatura. [...] Então me libertei da Lady Gaga como criador."
Foto: Reprodução/X/metalicvoga

Foto: Reprodução/X/metalicvoga

Foto: Reprodução/X/metalicvoga
